14/11/2009

Anglicanos, a saudade da casa paterna

  As orações dos anglicanos que desejavam entrar em plena comunhão com a Igreja Católica foram mais do que atendidas». Foi com essas palavras que o primaz da Comunhão Anglicana Tradicional, John Hepworth, arcebispo de Blackwood, na Austrália, comentou o anúncio feito por Bento XVI, no dia 20 de outubro, outorgando aos anglicanos desejosos de ingressar na Igreja Católica a liberdade de preservar a tradição espiritual e litúrgica de sua Igreja de origem.

A decisão do Papa foi a resposta a uma solicitação feita por dezenas de bispos e centenas de grupos de fiéis, inconformados com a decisão tomada por suas lideranças de conceder o sacerdócio e o episcopado às mulheres e aos homossexuais e de abençoar uniões entre pessoas do mesmo sexo. A maioria deles pertence à Comunhão Tradicional Anglicana, uma Igreja que se separou da Comunhão Anglicana original. Presente em vários países, compõe-se de aproximadamente 400.000 pessoas. Em 2008, ela pediu para voltar a fazer parte da Igreja Católica Apostólica Romana.

Como se lembra, a Igreja Anglicana nasceu de uma cisão na Igreja Católica, efetuada no século XVI, quando o Rei Henrique VIII, por razões políticas e pessoais, declarou que a Igreja na Inglaterra deixaria de estar unida ao Papa. Desde então, os anglicanos desenvolveram tradições litúrgicas próprias, diferentes mas nem sempre conflitantes com a doutrina católica. Hoje, a Comunhão Anglicana é formada por 80 milhões de fiéis, divididos em várias "províncias" independentes umas das outras, mas em comunhão entre si. É a terceira maior igreja cristã do mundo, depois da Católica e da Ortodoxa.

Referindo-se à futura constituição apostólica que legislará sobre o assunto, Dom Hepworth acrescentou: «Com ela, Bento XVI nos oferecerá os meios para que os anglicanos entrem em plena comunhão com a Igreja Católica. O Papa quer dedicar seu pontificado à causa da unidade. Este é um momento de graças, um momento histórico, não porque o passado se apagou, mas porque se transformou».

Rowan Williams, arcebispo de Canterbury e primaz da Igreja da Inglaterra, recebeu com serenidade a notícia da criação de uma estrutura canônica particular para os anglicanos que aderirem à fé católica. Foi o que expressou numa declaração conjunta com o arcebispo católico de Westminster, Vincent Gerard Nichols: «Este anúncio põe fim a um período de incertezas para muitos grupos que nutriam esperanças de novas formas de unidade com a Igreja Católica. A futura constituição é um reconhecimento da substancial convergência na fé, na doutrina e na espiritualidade entre a Igreja Católica e a tradição anglicana. Sem os diálogos dos últimos 40 anos, este reconhecimento não teria sido possível, nem tampouco se teria nutrido a esperança de uma plena e visível comunhão».

Em seu encontro com os jornalistas, o cardeal William Joseph Levada, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, explicou as razões que levaram a Igreja Católica a tomar essa medida: «Os anglicanos que se puseram em contato com a Santa Sé expressaram claramente seu desejo de uma plena e visível comunhão na Igreja una, santa, católica e apostólica. Ao mesmo tempo, nos falaram da importância de suas tradições ligadas à espiritualidade e ao culto. O Papa pensa numa estrutura canônica formada por ordinariados pessoais, que permitirão aos fiéis ex-anglicanos de entrar na plena comunhão da Igreja Católica, conservando os elementos de seu patrimônio espiritual e litúrgico específico».

Os ordinariados pessoais nos remetem a figuras jurídicas como a "Prelazia do Opus Dei", à "Administração Apostólica São João Maria Vianney" e aos "Ordinariados Militares", formadas por fiéis que não dependem de dioceses territoriais. Assim, os anglicanos que voltarem à Igreja contarão com bispos, sacerdotes e seminaristas próprios. A nova constituição permitirá aos pastores anglicanos casados que passem a ser presbíteros da Igreja Católica, acompanhados pela esposa e filhos. Esta exceção já estava em vigor desde o ano de 1994, quando, após a primeira ordenação de mulheres na Igreja Anglicana, vários sacerdotes pediram para entrar na Igreja Católica, conservando o estado clerical. Quanto aos bispos casados, serão recebidos na Igreja Católica como presbíteros. De acordo com as palavras do cardeal Levada, isso se deve a «razões históricas e ecumênicas», já que, tradicionalmente, o ministério episcopal está ligado ao celibato, inclusive na Igreja Ortodoxa e nas Igrejas Católicas Orientais.

13.Nov.2009

Dom Redovino Rizzardo, cs*
(Site do jornal O Progresso)

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